Ruy Martins Altenfelder Silva*
Falta de segurança, má qualidade da educação e fragilidade institucional. Eis os três fatores que, há dois anos, mantêm o Brasil imobilizado na 45ª posição entre os 104 países que compõem o terceiro ranking internacional da prosperidade, elaborado pelo Legatum Institute, com base em dados coletados durante mais de quatro décadas e analisados com consultoria de especialistas acadêmicos em economia, história, sociologia, ciência política e desenvolvimento. Trata-se de um indicador que objetiva medir a riqueza e bem-estar de nações que, somadas, abrigam mais de 90% da população mundial, segundo os organizadores do estudo. Para a composição da lista são considerados nove indicadores, chamados de subíndices. Em apenas um – liberdade individual – o Brasil integra o terço superior do ranking. Outros quatro – economia, empreendedorismo, capital social e saúde – empurram o País para a faixa dos medianos.
Mas a avaliação piora, e muito, nos quesitos segurança (76º lugar), educação (75º) e governança (60º). O relatório que acompanha o ranking registra que apenas dois em cada cinco brasileiros se sentem seguros ao caminhar para casa. Aponta “insatisfação com um sistema educacional percebido como baixo em qualidade e escasso em oferta”. E destaca que a percepção de governança permanece “medíocre”, com “baixa” confiança nas instituições democráticas e com níveis de confiança da sociedade nos seus próprios cidadão dos mais reduzidas entre os países analisados.
Os analistas partiram da premissa corretíssima que bem-estar e satisfação dos povos não têm como parâmetro as gordas taxas de crescimento econômico. “Escolha e oportunidades são mais importantes para a felicidade do que ganhar dinheiro rapidamente", sentencia o relatório. Exemplo citado? O grupo Bric (Brasil, Rússia, Índia e China), que vêm pontuando como indutores de expansão da economia mundial, mas não primam em outros indicadores. Detentora de significativos avanços em economia, empreendedorismo, governança e capital social, a China amarga graves deficiências em educação, saúde, segurança e liberdade pessoal. Após os atentados terroristas de 2008 em Mumbai, houve forte queda nos níveis da liberdade na Índia, com aumento da intolerância para com os imigrantes.
Na Rússia, a escalada do crime organizado, as restrições à liberdade individual e de expressão são os fatores que pressionam o índice de prosperidade para baixo. Os analistas, entretanto, reconhecem que "não é fácil ser próspero em países grandes e populosos", pois estes enfrentam desafios muito maiores do que nações menores, com a exceção de praxe: os Estados Unidos.
Saindo um pouco das nossas fronteiras, vale lançar um olhar sobre os vizinhos, até como subsídio para discussões sobre os rumos da diplomacia brasileira. No ranking da América do Sul, Uruguai (33º lugar), Chile (36º) e Argentina (38º) estão no topo do recorte regional, com seus habitantes afirmando desfrutar bons níveis de liberdade individual. Já a Venezuela (74º) fecha o bloco, na esteira da Bolívia (73º) e Equador (71º) ...
Deixando as com para ções de lado, fica evidente que as graves deficiências estão na base dos gargalos que emperram o desenvolvimento nacional e alimentam um outro indicador negativo ao País e que acaba de ser divulgado internacionalmente pela ONU. Trata-se do novo e segundo ranking do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), que leva em conta as disparidades regionais dos países analisados. Batizado de IDH-D, faz com que o Brasil despenque 15 posições, quando cotejado com o IDH tradicional, no qual o País subiu para 73º lugar entre 169 países, considerando apenas educação, saúde e renda.
O salto de quatro posições no ranking tradicional, do ano passado para cá, confirma avanços já percebidos, louvados e aplaudidos – porém, insuficientes para assegurar as desejáveis taxas de crescimento econômico e da qualidade de vida dos brasileiros. Aliás, não só desejáveis como possíveis, caso os governantes se dispusessem a enfrentar, com vontade política e competência técnica, os entraves ao desenvolvimento sustentável. A começar pela educação, que vem registrando nos últimos 15 anos melhoras quantitativas, mas ainda sofre de gravíssimas deficiências, facilmente comprováveis pelo lamentável desempenho dos nossos estudantes em avaliações nacionais e internacionais.
Ninguém, de boa fé, se arriscaria a negar que a má qualidade da educação é fator limitante do desenvolvimento, como sentem agudamente as empresas que se veem obrigadas a importar profissionais aptos a atender a seus planos de expansão, porque não encontram no mercado de trabalho interno candidatos que atendam aos requisitos da moderna economia. O próprio CIEE, para bem cumprir sua missão de inserir os jovens no mundo do fazer, se sentiu obrigado a promover cursos gratuitos para melhor qualificar os estudantes que compõem seu banco de talentos e estão em busca de uma oportunidade de estágio oferecida pelas empresas, para completar a formação acadêmica com a indispensável prática.
Esse exemplo deixa claro a importância da conjugação de esforços de toda a sociedade – preferencial, mas não necessariamente capitaneada pelos governos – para vencer o enorme desafio da educação. É essa postura, e não protestos contra indicadores internacionais, que fará o Brasil se aproximar da Finlândia, Noruega, Austrália e Nova Zelândia, que lideram tanto o ranking da prosperidade, quanto o do IDH.
*Presidente do Conselho de Administração do Centro de Integração Empresa-Escola (CIEE) e da Academia Paulista de Letras Jurídicas
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